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Augusto César Dall’Agnol - 117 - Junho de 2018
O desgastante embate pelo poder
Foto da capa do livro A Tragédia da Política em Ricardo III
A Tragédia da Política em Ricardo III
Autor: José Renato Ferraz da Silveira
Editora: Azougue - 160 páginas
Foto do(a) autor(a) Augusto César Dall’Agnol

Na obra A Tragédia da Política em Ricardo III, de José Renato Ferraz da Silveira, como aludido no prefácio pelo professor Miguel Wady Chaia, observamos que a política é uma atividade tipicamente humana caracterizada pelo binômio: motivação pelo poder e a inevitabilidade do conflito. Surge daí uma das novidades da nova perspectiva de compreensão da política, ou seja, o reconhecimento da permanência do conflito. Caracterizar, portanto, a política moderna ou contemporânea é entendê-la como jogo de forças opostas resultantes dos inconciliáveis desejos humanos. Tal "choque de interesses" evidencia o caráter trágico do jogo político - a ascensão e queda.

A política, dessa maneira, é vista com ideias e premissas realistas: a) visão pessimista da natureza humana; b) convicção de que a política é necessariamente conflituosa; c) a tragédia da política está sempre presente no jogo e da disputa pelo poder; d) coalizões e intrigas palacianas são instrumentos da conquista e da manutenção do poder; e) a conquista pelo poder é um traço marcante da política moderna, principalmente pela via criminosa e atroz.

A política, portanto, é uma arena de rivalidade, conflito e guerra, em que os homens defendem seus interesses e buscam garantir a sua sobrevivência nos diversos embates da política do poder. Na abordagem de Silveira sobre Shakespeare, coexistem continuidade e ruptura, um espaço que a ordem e a harmonia, simultaneamente, constitui-se pela presença do acaso e pela necessidade de evitar o que, na verdade, é inevitável. Tais paradoxos e conflitos agônicos estão sempre presentes nas peças de Shakespeare. E uma peça que expressa a tragédia da política é Ricardo III. A obra Ricardo - em análise - por Silveira nos revela o titânico encontro entre arte e política. O autor busca demonstrar e interpretar a política no seu significado polissêmico e, sem dúvida, através da literatura elucida questões das lutas pelo poder. Ao ampliar as fronteiras do conhecimento e agregar novas potencialidades para a área da Ciência Política, Silveira fundamenta seu estudo em duas direções que se complementam: a análise interna da obra de Ricardo III de William Shakespeare; e a análise externa, estudo histórico, discutindo os acontecimentos concretos que envolveram o rei Ricardo III.

Silveira nos mostra que na obra Ricardo III, testemunhamos a selvageria pessoal e a brutalidade das batalhas. Indivíduos e sociedades que estão em permanente luta, "o que gera a orgânica reciprocidade entre política e guerra" (CHAIA apud SILVEIRA, 2012, p. 14). Cabe observar a criatividade e a articulação em torno do conceito de "tragédia na política" ou "política como tragédia". Essa ideia elucida a trajetória de ascensão e queda de Ricardo III e aponta tanto para as possibilidades e entraves da política. Como afirma Chaia (2012, p. 16):

ela supõe que a política é um reino portador de carga de negatividade para o indivíduo e para o coletivo, ao mesmo tempo em que é uma esfera de viabilidade para a vida em sociedade. Assim, mesmo que a política, como invenção, venha a atender às necessidades dos indivíduos e das sociedades, a sua realização também pode ser danosa para essas entidades. Tais paradoxos estão sempre presentes nas peças de Shakespeare e José Renato tira bom proveito dessa tensa dimensão da vida social.

O conceito de política como tragédia - central nesta obra - aponta para a incerteza, a imprevisibilidade e o descontrole como fatores das conjunturas políticas. Numa tradição que envolve Nietzsche e Maquiavel, Hobbes e Marx, "a política como tragédia aponta para a insuficiência das práticas políticas e clarifica que o governante (ou o indivíduo) não tem controle absoluto de suas ações" (CHAIA apud SILVEIRA, 2012, p. 16).

O livro trata do potencial com que a política pode contribuir ou impedir a melhoria da condição humana e que o poder político permeia as relações humanas e sociais de forma intensa e, por vezes, devastadora, o que na leitura atenta de Jean-Marie Domenach, todos somos, ao mesmo tempo, vítimas e culpados, ao estarmos imersos no mundo da política.

Por fim, este livro de José Renato como pontua Chaia (2012, p.17):

nos mostra a trágica vida política, pois qualquer sujeito que age em busca do poder político é introduzido no embate, tendo de um lado, o desejo e a determinação humana e, de outro, um processo baseado na Razão de Estado, portador de uma lógica própria e imperiosa. O livro trata desse desgastante embate, no qual até hoje - queiramos ou não - estão envolvidos governantes e governados.

         

Referência Bibliográfica

CHAIA, Miguel (Org.). Arte e Política. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2007.

Augusto César Dall'Agnol é mestrando do Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 

Augusto César Dall’Agnol
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